domingo, 20 de abril de 2008
A degradação de Olinda
Clóvis Cavalcanti
Economista e pesquisador social
Em 24 de dezembro de 2000, de volta a Pernambuco depois de mais de dois meses em Oxford, Grã-Bretanha, escrevi no Diario que a sensação de que o estado de degradação urbana em Pernambuco se agravou não pode ser evitada. "Há alguma coisa de equivocado com nossas cidades que precisa urgentemente de análise, de empenho e de vontade política para ser refeita. Estamos construindo ambientes para a nossa vida que nos causam mal-estar. Na primeira corrida matinal de meu regresso, o que vi de sujeira em uma Olinda abandonada foi assustador. Além disso, buracos nas ruas e calçadas, monumentos dilapidados, cartazes de propaganda (os mal-chamados "outdoors", pois a palavra, que é inglesa, não significa o que aqui lhe atribuem) mal colocados e mal concebidos depõem contra as maravilhas que uma cidade tão ímpar como Olinda sempre exibiu. É triste ver o grau de nosso subdesenvolvimento se manifestando de maneira tão declarada, revelando nossos baixos níveis de cultura, de educação e de compromisso com a gestão do bem público". Pois bem, retorno de mais uma ausência maior, desta vez nos Estados Unidos - com passagem na volta em Cambridge (Inglaterra) e Lisboa, dois belos lugares - e me deparo com uma situação talvez pior do que a de 2000. O aspecto visual de Olinda, hoje, é aterrador. Em 2000, a prefeita Jacilda Urquiza tinha perdido a reeleição, desencantou-se, deu as costas à cidade. Foi o que se viu. Agora, a prefeita Luciana Santos ainda vai tentar fazer seu sucessor; mas consegue chegar em situação mais lamentável do que a de sua antecessora.
Quem entra em Olinda (não penso nem nos coitados dos turistas desavisados), não tem como evitar o desagrado de passar pela av. Sigismundo Gonçalves, um cartão de visitas lastimável. Tudo ali contribui para a degradação urbanística: postes monstruosos, mais apropriados para uma distante avenida perimetral de metrópoles como Lagos ou Luanda; pista muito defeituosa; calçadas arrebentadas; canteiro entre pistas sem a mínima inspiração de bom-gosto. No Carmo, o quadro causa pena. Lá, como no Varadouro, há cartazes de muita feiúra que anunciam obras, fazem propaganda institucional, exibem alegremente nossa condição de subdesenvolvidos (pois esse tipo de horror visual é desconhecido em qualquer cidade bem cuidada do mundo, até mesmo no Nordeste, como é o caso de Acari, no Seridó do Rio Grande do Norte). A prefeitura de Olinda, sem maior informação e consulta à cidadania, está rasgando áreas como a do acesso às praias, ameaçando o Fortim do Queijo (diz-se que é para sua recuperação). O cenário ali mais parece da passagem de um tsunami. Supõe-se que depois melhorará, mas o custo ambiental e paisagístico não justifica o que se está fazendo. Junto do forte há, aos sábados, uma excelente feirinha de produtos orgânicos, que ficou totalmente prejudicada. Uma iniciativa que deveria merecer o maior respaldo da Prefeitura é tratada com displicência. Nesse ínterim, teme-se que o local da feirinha e adjacências vá ser mais um terrível espaço de eventos.
Olinda parece não ter nenhum compromisso com seus atrativos turísticos e condição de patrimônio histórico da humanidade, um título, depois de muitas lutas, que lhe foi conferido pela Unesco. Pois como é que um centro cultural que deveria valorizar iniciativas de altíssimo nível se presta a transformar espaços públicos em centros de emissão de barulhos abomináveis? Somente falta de compromisso com valores elevados permite entender isso. Nenhum turista virá de qualquer lugar decente para aturar os sons que os moradores de Olinda, como meus vizinhos e eu, somos obrigados a escutar, vindos de fora de casa e impedindo que se ouça a música de preferência de cada um. Não quero que ninguém tenha meus gostos, que seja forçado a admirar Bach ou Mozart. Contudo, querer impor o lixo musical que nossos baixos foros de civilização estão criando é insuportável. Com isso, sofre a boa hotelaria olindense, como a do Hotel 7 Colinas; sofrem os residentes de conventos e noviciados; sofrem moradores que pagam impostos. Em troco de quê? De nada. Ou melhor, da antítese daquilo que faz a vida melhor. Na verdade, valoriza-se o feio, o barulhento, o deformado. Despreza-se a busca da qualidade, do belo, do sublime. Francamente, é de entristecer a forma como Olinda se degrada.
http://www.pernambuco.com/diario/2008/04/20/opiniao.asp
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Um comentário:
I can't understand it but it seems like a nice blog. Have a great week
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