terça-feira, 11 de março de 2008

Gente de Olinda: Véio da Bodega


Tem um cantinho na Rua do Amparo que existe há mais de 100 anos. Lá, moradores e turistas encontram de tudo: pente, escova de dentes, pilhas, filme fotográfico, desinfetante, comprimidos para dor-de-cabeça, pão, cerveja gelada, embutidos... Está tudo pendurado ou encaixado nas prateleiras, sempre com espaço para mais. Uma diversidade que, para o proprietário da bodega, representa o espírito criativo de Olinda.

Véio, ou Edval Hermínio da Silva no batismo,48, chegou no local em 1981. O negócio era mantido pela família por gerações. Recém-casado, comprou o ponto de um primo, na certeza de que ali construiria nova vida. O que ele não esperava era que sua simples mercearia se transformaria na famosa Bodega do Véio, ponto de parada obrigatória para boêmios e visitantes da cidade. Em sua avaliação, um reflexo do movimento natural do lugar. "Olinda não pára. Está em constante movimento. A arte está cravada na energia, nas ruas, nas pessoas", diz ele emendando o questionamento: "Em que outro lugar uma bodega virariaum centro cultural?", define o espaço.

Se pela manhã ele abre as portas da mercearia para atender passantes, à noite empresta a calçada para pequenas apresentações musicais. Lá, também há discos de artistas locais à venda, quadros, livretos com poesias. "Quer saber como me sinto? Simplesmente sou um prestador de serviços para esta cidade que escolhi para ser minha", diz ele ao lado da mulher Bernadete e, sem soltar uma palavra negativa, ainda completa: "Tenho orgulho de ter quatro filhos olindenses. A cidade me deu oportunidade de criar todos eles bem. Um formado, dois estão na faculdade e a mais nova estuda logo ali, na Academia Santa Gertrudes, no Alto da Sé".

Véio, por mais estranho que pareça, ganhou o apelido logo que nasceu. "Meus pais me chamaram assim nos primeiros minutos de vida. Quando era jovem, não gostava. Mas é por esse apelido que todo mundo me conhece. Sou o Véio da bodega de Olinda", exprime com satisfação. Natural de João Alfredo, Agreste de Pernambuco, chegou em Olinda aos 17 anos para trabalhar com um tio. Em 1978 montou uma mercearia no bairro do Guadalupe. O negócio não deu certo. Olinda, na época, tinha as mesmas características atuais de "cidade dormitório", com muitas moradias e pouco comércio. "Mas não desisti. Olinda é como se fosse minha mãe. Desde o primeiro momento em que pisei aqui, me senti acolhido", revela e finaliza: "Não pinto e não sei riscar nada em papel. Mas me sinto artista, porque tenho minha bodega. Olinda faz as pessoas se sentirem assim, criativas. Só tenho a agradecer e estou disposto para melhorar este lugar sempre que puder".


http://www.pernambuco.com/diario/2008/03/12/viver1_1.asp

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