sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Centenário de nascimento de Dom Hélder Câmara


Esta talvez seja a homenagem mais significativa que faço em toda a minha vida parlamentar. Agradeço ao povo de Olinda de quem sou seu legitimo representante por mais de 16 anos. Faço também a todos os vereadores que aprovaram essa homenagem por unanimidade e especial ao Presidente, vereador Marcelo Soares que estimulou e mobilizou-se para efetivação dessa sessão solene comemorativa ao Centenário de nascimento de Dom Helder Câmara.

Permita-me resgatar resumidamente sua história de luta em defesa de uma nova igreja e dos direitos humanos.

Dom Helder Câmara, teve destacada atuação na fundação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB; na organização da Campanha da Fraternidade; no Movimento ano 2000 Sem Miséria, que inspirou os comitês e a bela e humanitária campanha do Betinho – Ação da Cidadania Contra a Fome e a Miséria Pela Vida.

Foi ele sem dúvida, símbolo de uma nova igreja, e com certeza, figura humana mais completa, merecedora do Premio Nobel da Paz. Profeta da Utopia, Pastor da Liberdade, principal personalidade do século passado. Fazia parte do conjunto de teólogos, bispos e demais responsáveis pela direção e doutrina eclesiástica que defendia uma atuação mais abrangente da Igreja no mundo, especialmente na América Latina.

Na época em que se encontrava na direção da arquidiocese de Olinda e Recife, houve importantes experiências sociais e eclesiásticas, inspiradas no humanismo de sua fé e reflexão teológica, sendo denominado carinhosamente pelos seus amigos e seguidores de Dom: Dom Amor, da Paz e da Justiça Social;

Essa sua postura incansável na defesa dos mais necessitados e injustiçados, em um período difícil da vida nacional, quando a democracia foi golpeada, as liberdades suprimidas, as torturas e assassinatos eram praticados por aqueles que tinham a obrigação e o dever de preservá-las em defesa da ordem e da paz social.

Permita-me agora relatar minha experiência vivenciada com Dom Helder Câmara e pela minha família, especialmente, por minha mãe ELZITA SANTA CRUZ. Resumidamente, iniciou-se com sua chegada ao Recife, fato ocorrido no dia 11 de abril de 1964, um sábado chuvoso, encontrava-me nos meus 20 anos, na Matriz de Santo Antônio, no meio da multidão, saboreando, cheio de esperanças, cada palavra proferida pelo novo Arcebispo de Olinda e Recife. Após o ato de recepção, segui para minha residência em Olinda, certo de que teríamos um aliado na luta pelo retorno do Estado Democrático de Direito, o que imaginava próximo de acontecer. Ledo engano, passaram longos 25 anos. Não imaginava que a partir daquele momento Dom Helder não seria apenas um aliado, mas talvez! Quem sabe! O principal opositor do regime militar, do arbítrio e da violência no Brasil. Foi ele confidente, parceiro atencioso, autor de corajosas denúncias e providências, participe do drama vivido pela minha mãe, quando seus filhos e filhas foram presos (as), seqüestrados (as), exilado, cassado em seus direitos estudantis pelo decreto lei 477/69. Finalmente o desaparecimento forçado, refiro-me a Fernando Santa Cruz, que simboliza todos (as) mortos sem sepultura. Portanto, Dom Helder não foi somente testemunha dessa história, mas protagonista, solidário e amigo do sofrimento e da dor. Trago aqui uma carta por ele dirigida a minha mãe, datada de 27/03/1989, cujo teor é o seguinte:

Prezada amiga ELZITA SANTA CRUZ

“seu telegrama chegou, quando eu me achava na Europa, na Bélgica. Foi-me impossível participar aqui, do sempre oportuno movimento de conscientização diante da violência, em suas numerosas manifestações.
Quando circulo fora do Brasil, aproveito os convites numerosos para tentar ajudar a criar um mundo mais justo e mais humano.
Santa e Feliz Páscoa
Fraternalmente em Cristo
Helder Câmara.

É oportuno reproduzir um trecho de um manifesto de autoria de Dom Helder Câmara, utilizado em minha defesa em um dos inquéritos que respondi na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, fundamentado no decreto lei 477/69, que expulsava estudantes e proibia matricular-se em qualquer outra Universidade do pais pelo período de 3 (três) anos.

E por isso vale aqui a sua transcrição:

“Protesto sem ódio e apelo á consciência dos responsáveis. Como pastor da Igreja de Olinda e Recife, em união com o governo Colegiado da Arquidiocese, por um dever de consciência e no espírito na Ação Justiça e Paz, venho levantar um protesto sem ódio e tentar um apelo à consciência dos responsáveis a propósito da perda de direitos estudantis, medida que está atingindo, gravemente, um número sempre maior, em todo o país.

Eis as principais razões que tornam a aludida punição anti-psicológica e revoltante;
- fere, de cheio, a Declaração de Direitos Humanos (cfr.arts.8, 10,11.26)
- Tem efeito, retroativo em matéria penal;
- é incompreensível, sobretudo em pais em que apenas se acham nas universidades um 1% por cento daqueles que ali teriam direito de encontrar-se
- anula a autonomia universitária e obriga os professores a trocar a autoridade paterna, de que participam, por uma atitude policial que deles se exige;
- golpeia vidas adolescentes ou marginalizando os punidos ou os impelindo para os descaminhos da radicalização e da violência “(...)

Prossigo em minha defesa, “quem são os responsáveis a quem se refere e a quem se dirige o apêlo do insigne pastor?”

Lamentavelmente, não disponho de todo o manifesto, hoje 40 anos após, me penitencio em não haver transcrito o mencionado manifesto na íntegra. Faço votos de que consiga uma cópia no CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO DOM HELDER CÂMARA ( CEDOHC ). É oportuno contextualiza-lo no tempo e no espaço, lembro que á época encontrávamos-nos em plena vigência o AI-5, poucas vozes se alevantavam, entre elas, a do Pastor da liberdade e da Utopia, merecedor do Prêmio Nobel da Paz, principal personalidade do século passado.

Por fim, Olinda é devedora de todas as homenagens a Dom Helder Câmara. Adianto que já atendemos solicitação formulada a essa Casa Legislativa e providenciamos Projeto de lei que acrescenta o nome de Dom Helder Câmara na avenida Olinda, a qual passará a ser chamada avenida Olinda Dom Helder Câmara, pela vontade consciente e livre dos senhores vereadores que formam à Câmara Municipal de Olinda, a mais antiga do Brasil.



Permita-me por fim, concluir essa minha saudação, reportando-me ao pensamento de Dom Helder Câmara, reproduzido em cada placa, destinadas as entidades que nasceram e frutificaram do trabalho social desenvolvido por Dom Helder Câmara, INSTITUTO DOM HELDER CÂMARA (IDHEC); CENTRO DOM HELDER CÂMARA DE ESTUDOS E AÇÃO SOCIAL (CENDHEC); MULHERES CONTRA O DESEMPREGO, IGREJA NOVA, SERVIÇO COMUNITÁRIO DE JUSTIÇA E PAZ; PASTORAL DA JUVENTUDE DO MEIO POPULAR (PJMP); MOVIMENTO DOS TRABALHADORES CRISTÃOS (MTC) e CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB)..


“ QUANDO OS PROBLEMAS SE APRESENTAM
ABSURDOS, OS DESAFIOS SE TORNAM
APAIXONANTES”



Olinda, 12 de fevereiro de 2009

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Marcelo Santa Cruz
Vereador PT-Olinda

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